sábado, 9 de janeiro de 2016

Acolher os povos



Vim para o Brasil para reconstruir sonho de estudar, diz haitiano sobrevivente de terremoto
Dodô Calixto | São Paulo - 01/01/2016 - 09h00
Catástrofe no Haiti em 2010 interrompeu projeto de Robson Baptiste, 29 anos, de cursar Relações Internacionais; ele hoje vive em SP e busca voltar a estudar. Em 12 de janeiro de 2010, um terremoto de grande escala atingiu o Haiti, deixando mais de 300 mil pessoas mortas. Na ocasião, entre milhares de desabrigados nas ruas da capital Porto Príncipe, estava Robson Jean Baptiste. Com a catástrofe, o haitiano teve que interromper bruscamente os seus projetos.

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Nascido em Porto Príncipe, Haiti, Robson Baptiste chegou ao Brasil em abril de 2012

"Eu saí da escola (ensino médio) em 2008. Estava me preparando para prestar o vestibular que seria em janeiro (2010), exatamente quando o terremoto passou", relata Robson, hoje com 29 anos e morador do bairro do Glicério, SP. 

Os tremores destruíram a casa e o pequeno comércio da família de Robson. "O terremoto acabou com tudo. Não tínhamos para onde ir. Ficamos três meses dormindo na rua sem saber o que fazer", relembra.


A perda mais dolorida, no entanto, foi a morte de amigos nos escombros de Porto Príncipe. "O momento mais difícil foi saber que meus amigos tinham morrido. Foi quando resolvi viajar para bem longe para tentar esquecer aquele momento. A cada dia que passa, vou esquecendo um pouco mais. Aqui no Brasil é mais tranquilo", diz.

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Em 2012, dois anos e meio após a tragédia, Robson desembarcou em São Paulo. Desde então, entre idas e vindas em busca de trabalho, traçou o objetivo: cursar Relações Internacionais.

"O terremoto destruiu meu sonho de fazer universidade em 2010. Aqui (Brasil) tem mais oportunidades e quero reconstruir esse sonho. Espero conseguir trabalhar para juntar dinheiro e estudar Relações Internacionais", afirma.

Para Robson, a principal vantagem de estar no Brasil é ter “liberdade para trabalhar e não depender de ninguém para alcançar os objetivos”. “No Haiti era ruim para trabalhar. Aqui eu já trabalhei como garçom, em uma empresa de gás, entre outros. Gosto dessa liberdade e de não depender de ninguém”, afirma.



Perguntado se já procurou algum dos programas do governo para acesso ao ensino superior, Robson foi taxativo. “Nunca ouvi falar. Não sei como funcionam essas coisas para os imigrantes. O jeito é trabalhar”, diz, ainda sem saber se conseguirá estudar em 2016.

Medida do governo auxilia haitianos

Em novembro passado, em ação conjunta, os ministérios do Trabalho e Previdência Social assinaram a autorização e concessão de permanência a imigrantes de cidadania haitiana no Brasil. A concessão de permanência foi feita para 43.781 imigrantes, que chegaram no país desde 2010.

Com a medida, os haitianos terão até um ano para fazer a carteira de identidade de estrangeiro. “Esses haitianos passam a ser acolhidos formalmente com estabilidade e segurança. Nossa nacionalidade viva e em permanente construção nos permite acolher outros povos e suas diferenças. As nossas diferenças não nos afastam, mas nos aproximam. É exatamente na troca de experiências e culturas que nós crescemos e melhoramos”, disse em nota o Ministério da Previdência Social.

O ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, ressaltou que governo não está concedendo a cidadania brasileira aos haitianos, mas um visto de permanência do estrangeiro. “Essa autorização de permanência é muito importante porque ela supera a fase do visto provisório e dá uma perspectiva definitiva para que eles possam aqui residir utilizando e fazendo jus de todos os direitos que um estrangeiro tem no Brasil. Eles passam a ter novas oportunidades de trabalho, inserção social e participação em programas sociais. É um reconhecimento muito claro de que o Brasil é um país que acolhe seus imigrantes, que respeita direitos e não age de forma preconceituosa”, disse.